A medicina é uma das profissões mais antigas de que se tem
notícia. Desde as primeiras aglomerações humanas, das primeiras sociedades, inclusive
as mais primitivas, se tem notícia desse profissional, já chamados de
curandeiros e até mesmo de feiticeiros, pois se atribuía à cura, muitas vezes,
aos Deuses. Estima-se que o surgimento da medicina se deu há mais de 6.000 anos,
no oriente. Mas o grego Hipócrates, que viveu entre 460 a 377 a.C., é
considerado o pai da medicina. É, também, uma das profissões mais respeitadas.
Segundo o dicionário Aurélio, o vocábulo Medicina significa “Arte e ciência de evitar ou curar doença,
ou de paliar seus efeitos.” O médico, portanto, é o profissional que está
habilitado a exercer a medicina. Deve estar habilitado a curar as pessoas.
Ocorre que nem sempre a cura acontece. O resultado do
esforço médico empreendido pode não ser o esperado. Como, evidentemente,
ninguém reclama quando é curado, os conflitos surgem quando a doença permanece,
se agrava, gera uma lesão ou mesmo quando evolui para o óbito. A partir de um
resultado negativo, surgem os questionamentos: o profissional realizou o diagnóstico
correto? Poderia ele ter se valido de outro meio terapêutico mais adequado? Houve
erro por parte do médico? A resposta a esses questionamentos não é das mais
fáceis e vai depender de uma análise minuciosa de cada caso concreto, pois a
linha que divide a má prática médica (o que convencionou-se chamar “erro médico”)
da boa prática é tênue, muito sutil.
A medicina – assim como a advocacia – é profissão de meio e
não de resultado. Isto quer dizer que, assim como o advogado não está “obrigado”
a vencer uma causa, o médico não é necessariamente “obrigado” a curar o paciente.
Basta que se utilize de todos os meios necessários para atingir tal finalidade.
A exceção, aqui, é o médico cirurgião plástico, que tem a obrigação de obter o
resultado estético pretendido.
O tema em questão vem ganhando espaço significativo na
imprensa. Os consumidores desse serviço estão cada vez mais exigentes; e os
médicos, apavorados. Comumente um resultado negativo ou não esperado pode
resultar em litígios judiciais, o que é desgastante para ambas as partes. É preciso
saber distinguir a má prática médica da boa prática. Para tanto, é necessário
detectar se o médico agiu com culpa, em uma das modalidades imprudência, imperícia
ou negligência. Deve existir, ainda, o necessário nexo de causalidade entre a
conduta culposa e o resultado danoso. Dito de outro modo, o resultado danoso
deve estar vinculado à atuação culposa. Um típico erro médico ocorre, por
exemplo, quando numa cirurgia o profissional deixa algum instrumento dentro do
corpo do paciente, ou quando é operado o membro errado (já atuamos num caso em
que o profissional operou a perna esquerda do paciente quando a patologia
acometia a perna direita), que gera o dever de indenizar.
Uma vez constatada a conduta ilícita, o médico pode ser
responsabilizado penal e civilmente, bem como junto ao Conselho Regional de
Medicina (processo ético-disciplinar). No processo cível, o médico pode ser
condenado a reparar o dano causado, através de um pagamento de uma quantia em
dinheiro, arbitrada pelo Juiz da causa e conforme a extensão do dano (art. 944,
Código Civil). Na esfera penal, o médico pode ser condenado pelos crimes previstos
no Código Penal; os mais comuns são o homicídio e a lesão corporal. Já no
âmbito administrativo, em processo disciplinar, o médico pode tanto levar uma
advertência sigilosa quanto ter cassado o direito de exercer a profissão.
Não confundir, ainda, a má prática médica com a iatrogenia, que
pode ser definida como toda complicação, lesão ou reação adversa decorrente do
tratamento médico. Tal resultado pode ser decorrente ou não de erro. Um exemplo
típico são as queloides ou cicatrizes, o que nem sempre gera o dever de
indenizar.
Há, ainda, causas excludentes da responsabilidade do médico,
normalmente quando o paciente não segue as orientações prescritas, como por
exemplo: retirar o gesso antes da hora, incorrendo em nova lesão ou fratura;
tomar o medicamento por um período de tempo menor ou em dosagem superior; não
seguir a dieta/alimentação recomendada; enfim, uma série de fatores alheios à
atuação do profissional que podem excluir a sua responsabilidade.
Para tanto, o prontuário médico é um documento essencial, indispensável
para a segurança do profissional e também para o paciente. Nele deve conter
todo o histórico do tratamento realizado, com todas as minúcias. Neste documento
podem ser detectados tanto o erro como a correção do procedimento utilizado.
Atribui-se, ainda, a má prática médica à baixa qualidade do
ensino. Cada vez mais proliferam faculdades de medicina no país. Questiona-se,
ainda, sobre a necessidade de um exame de proficiência do profissional da
medicina, tal qual acontece com os advogados, com o exame da Ordem. Seria justo
e até mesmo preservaria os bons profissionais, pois saberíamos os percentuais
de aprovação e reprovação, o que serviria para mensurar a qualidade do ensino.
O que se vê, hoje, é um aumento significativo da quantidade
de demandas no Judiciário envolvendo médicos e pacientes. Aplica-se o Código de
Defesa do Consumidor, conforme já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
...
6. O Código de Defesa do Consumidor, em seu
art. 14, caput, prevê a responsabilidade objetiva aos fornecedores de serviço
pelos danos causados ao consumidor em virtude de defeitos na prestação do
serviço ou nas informações prestadas - fato do serviço. Todavia, no § 4º do
mesmo artigo, excepciona a regra, consagrando a responsabilidade subjetiva dos
profissionais liberais.
(STJ - EDcl nos EREsp 605435 / RJ)
Devemos destacar, ainda, que tanto a operadora de saúde como
o profissional credenciado podem ser responsabilizados:
AGRAVO
REGIMENTAL NO AGRAVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. OPERADORA DE
PLANO DE SAÚDE. ERRO
MÉDICO.
1.- A operadora
de plano da saúde responde por falhas nos serviços prestados por profissional médico
credenciado. Precedentes desta Corte.
(STJ - AgRg
no AREsp 194955 / RJ. )
Como se vê, não é rara a responsabilização do profissional
da medicina em razão de sua atuação, pois o judiciário tem frequentemente
acolhido as pretensões indenizatórias por parte de consumidores lesados. As condenações
judiciais servem como verdadeiro instrumento repressivo e até mesmo pedagógico,
desestimulando tais práticas.
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