PROCEDIMENTO COMUM DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5008083-73.2012.404.7202/SC
AUTOR : E.B.D.
ADVOGADO : RAFFAEL ALBERTO RAMOS
RÉU : UNIÃO - FAZENDA NACIONAL
SENTENÇA
Trata-se
de embargos de declaração opostos na forma do art. 535 e seguintes do
CPC, em que se sustenta a existência de nulidade, omissão e contradições
na sentença proferida no evento 24.
Decido.
São
cabíveis embargos de declaração quando houver obscuridade, contradição
ou for omitido ponto sobre o qual o juiz deveria se pronunciar. Outra
hipótese de manifestação do juiz, após proferido o julgado, ocorre nos
casos de inexatidões materiais ou erros de cálculo que podem ser
corrigidos ex officio pelo julgador. São estes os pressupostos de
admissibilidade dos embargos, de modo que, para hipóteses diversas, uma
vez proferida a sentença, é defeso ao juiz retratar-se para mudar-lhe o
teor, ficando adstrito em seu pronunciamento a sanar eventuais omissões,
contradições ou obscuridades e, ainda, corrigir-lhe erros materiais ou
de cálculo.
Analiso o caso concreto.
1) Seria nula a sentença por adotar, para rejeição do pedido, causa de pedir não ventilada na petição inicial:
Também
vislumbra-se [sic] a nulidade quando a sentença trouxe por fundamento
causa de pedir não relatada pelo demandante - essa é a taxada
incongruência objetiva, de acordo com Didier Jr. (2010). Ao referir que
os recolhimentos serão de alguma forma incorporados para o cálculo da
renda, o Juiz escapa aos limites da causa de pedir imposta pela parte
autora, o que configura a prolação de sentença extra petita.
Basicamente,
a fundamentação da sentença de improcedência com argumento não
mencionado na petição inicial caracterizaria a nulidade da sentença.
Considerando-se então que a Fazenda Pública não conteste a ação - ou o
faça deficientemente, sem abordar o ponto entendido como relevante pelo
magistrado - o julgador estaria impedido, sob pena de nulidade da
sentença a ser proferida, de julgar improcedente o pedido, desde que o
autor não tenha, em sua petição inicial, feito referência ao fato
impeditivo de seu alegado direito ou a interpretações contrárias a seus
interesses, que, dessa forma, não poderiam ser abordadas, de ofício (?),
na sentença, sob pena de violação ao princípio da congruência.
A tese é
tão brilhante que deve o autor levá-la ao relator do projeto do novo CPC
para que venha a ser acolhida no novo código. Por ora, porém, na
vigência do atual CPC - arcaico, não estando à altura do brilhantismo
ímpar da tese evidentemente genial (!) do embargante -, o acolhimento,
de ofício, de fundamento apto, por si só, para rejeição do pedido, não
abordado na petição inicial ou em contestação, caracteriza pura e
simplesmente a aplicação do direito ao caso concreto (narra mihi factum
dabo tibi jus), não estando o Juiz vinculado à linha de argumentação de
qualquer das partes, máxime em se tratando de matéria de direito
público, em que incide a indisponibilidade dos interesses de ordem
tributária, não sujeitos a serem comprometidos em razão de supostas
deficiências na contestação da Fazenda Nacional, ou mesmo a linhas de
argumentação expostas nas petições iniciais que não sejam passíveis de
afastamento mediante acolhimento de fundamentações externas, não
mencionadas internamente àquilo que o autor, impropriamente, chama de
'causa de pedir'.
O que se
tem, na espécie, é pura e simplesmente um pedido de reconsideração,
travestido de embargos de declaração, cujas implicações processuais
serão abordadas mais à frente.
2) Seria omissa a sentença por não ter considerado o recente entendimento da Turma Recursal de Santa Catarina sobre o tema.
Observo
que a sentença mencionou de forma expressa o entendimento da TRSC,
favorável ao acolhimento do pedido, e rejeitou seus argumentos, adotando
de forma motivada orientação diversa.
Portanto,
o que se tem na espécie é pura e simplesmente um pedido de
reconsideração, travestido de embargos de declaração, fundado em
supostamente nova (ou mantida) orientação jurisprudencial mais benéfica,
cujas implicações processuais serão abordadas mais à frente.
3) Seria
contraditória a sentença porque, concluo, em síntese, não acolheu -
agora meritoriamente - a tese de brilhantismo ímpar, de elaboração
claramente genial do embargante, com linha de raciocínio muito acima da
inteligência mediana da comunidade jurídica.
Observo
que toda a argumentação consiste pura e simplesmente num pedido de
reconsideração, travestido de embargos de declaração, fundado em
repetição de argumentos já antes expostos na petição inicial e abordados
na sentença, que refutou sua alegada procedência.
Observo
também que o embargante, Técnico Judiciário em exercício no JEF desta
Subseção, em causa cujo valor é de R$ 1.000,00, dá-se o trabalho de
redigir embargos de declaração sabidamente incabíveis e de extremamente
improvável acolhimento, supostamente por meio de advogado, de 6 (seis)
páginas, nas quais tem o atrevimento de dizer que a sentença julgou
contra a Lei. É lamentável ver um servidor da própria Justiça Federal
cuspindo no produto (sentença) da atividade fim da instituição a que
pertence, que paga seu salário e que sustenta sua família.
Discordâncias, sempre, devem ser demonstradas de forma cordial e
respeitosa, máxime em ações movidas por integrante - estagiário,
servidor ou magistrado - da própria instituição, não sendo os embargos
de declaração o veículo adequado para que o subordinado, supostamente
por meio de advogado, aproveite para dizer ao chefe aquilo que, frente à
frente, não teria coragem, nem autoridade, para dizer. Quero deixar
registrado que outro(a) magistrado(a) desta Subseção tomou conhecimento
do teor da sentença e dos embargos, espontaneamente, sem provocação de
minha parte, de forma acidental, comentando-me o lamentável e evidente
propósito dos embargos de desqualificar decisões judiciais.
Neste
sentido, não perco a oportunidade de registrar que, no dia em que o
embargante for aprovado no concurso de Juiz Federal, aos 27 anos de
idade, em três oportunidades, obtendo um primeiro e um segundo lugares
(sendo que neste último caso o primeiro lugar somente foi assumido por
terceiro candidato após a pontuação dos títulos), terá condições
intelectuais de dar lições de processo civil a este julgador - refiro-me
às imperdíveis lições relativas à suposta incongruência objetiva
(Didier, 2010) -, devendo, até lá, situar-se dentro da comunidade
jurídica e atuar dentro de suas limitações, seja de ordem jurídica, seja
de ordem hierárquica, lembrando-se que, nas não raras ausências dos
Juízes Titular e Substituto do Juizado Cível, tenho a titularidade plena
deste órgão judiciário, oportunidade em que, qualquer que seja o
entendimento de servidores e magistrados nele atuantes, jamais serão
eles taxados de contrários à Lei, mas eventualmente substituídos por
outros, considerados mais adequados, da mesma forma pela qual,
entendendo um servidor que a decisão judicial é contrária à Lei, deverá
respeitar o entendimento dissonante de suas compreensões, levando seus
reclames ao órgão recursal competente, abstendo-se de utilizar recurso
inadequado para cutucar magistrado ou para tentar dar aulas de Direito
para as quais não tem qualificação nem conhecimento jurídico
suficientes.
Analisados
os três apontados defeitos (nulidade, omissão e contradição), concluo
que o embargante rasga o dicionário tentando, a todo custo, enquadrar
como omissões, contradições e nulidades aquilo que, de forma clara,
consiste em simples pretensão de prevalência de seu entendimento sobre o
tema.
Passo então à análise das implicações processuais decorrentes.
1)
Considerando a incúria no manejo dos embargos de declaração, interpostos
de forma nitidamente incabível, com propósitos inadmissíveis nesta
espécie processual, constato a presença de embargos manifestamente
protelatórios, aos quais se dirige a sanção prevista no art. 538 do CPC:
Art. 538.
Os embargos de declaração interrompem o prazo para a interposição de
outros recursos, por qualquer das partes. (Redação dada pela Lei nº
8.950, de 1994)
Parágrafo
único. Quando manifestamente protelatórios os embargos, o juiz ou o
tribunal, declarando que o são, condenará o embargante a pagar ao
embargado multa não excedente de 1% (um por cento) sobre o valor da
causa. Na reiteração de embargos protelatórios, a multa é elevada a até
10% (dez por cento), ficando condicionada a interposição de qualquer
outro recurso ao depósito do valor respectivo
Aplico a multa de 1%, portanto.
2) Os
embargos incabíveis têm, em geral, sido reconhecidos pela jurisprudência
como interruptivos do prazo recursal. Em regra, apenas os embargos
intempestivos não têm o condão de interromper o prazo do recurso cabível
(apelação / recurso inominado). Trata-se de orientação jurisprudencial
benéfica, destinada a evitar situações de discordância em comuns zonas
cinzentas, dúbias, quanto a se ter, ou não, omissões e contradições no
julgado.
No caso,
porém, ficou evidente a natureza estritamente modificativa, de pedido de
reconsideração propriamente dito - para não se falar em propósitos
menos nobres -, dos embargos opostos contra a sentença, que de modo
expresso fundamentou, exaustivamente, as questões supostamente omitidas.
O que se percebe é que houve, por todos os fundamentos expostos nos
EDcl, um pedido de reconsideração, travestido de embargos de declaração.
Em tal hipótese, os embargos não têm efeito interruptivo, conforme
decidido pelo STJ e divulgado em seu informativo n. 509:
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL. PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. NÃO
INTERRUPÇÃO DO PRAZO RECURSAL. Os embargos de declaração consistentes em
mero pedido de reconsideração não interrompem o prazo recursal. Os
embargos de declaração, ainda que rejeitados, interrompem o prazo
recursal. Todavia, em se tratando de pedido de reconsideração, mascarado
sob o rótulo dos aclaratórios, não há que se cogitar da referida
interrupção. Precedente citado: REsp 964.235-PI, DJ 4/10/2007. AgRg no
AREsp 187.507-MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 13/11/2012.
No âmbito
do TRF-4, o entendimento não é outro, valendo salientar, também, que o
nomem iuris (formal) da peça processual (embargos de declaração) não
define o que ela, em verdade (substancialmente), é (pedido de
reconsideração):
[...] 1.
Os embargos de declaração são meio processual idôneo para veicular
pretensão atinente à hipótese objeto do artigo 535 do CPC. A ausência de
tais situações hipotéticas fragiliza a utilização do remédio
processual. 2. A causa de pedir e o pedido concernentes à rediscussão do
mérito da decisão, conquanto articulados em peça nominada de
aclaratórios, revela pedido de reconsideração. A classificação da peça
processual deriva do seu conteúdo e não do nomen juris a ela conferido.
3. O pedido de reconsideração não ostenta aptidão para interromper o
prazo para interposição de recursos. Precedentes. 4. [...] (TRF4, AG
0004345-74.2011.404.0000, Quarta Turma, Relator Luís Alberto D'azevedo
Aurvalle, D.E. 26/11/2012)
No âmbito
do procedimento do JEF, os embargos excepcionalmente suspendem, e não
interrompem, o prazo do recurso cabível (Lei n. 9.099/95, art. 50).
Portanto, aplicando-se o entendimento do STJ, o efeito produzido será,
no caso, de não suspensão do prazo de interposição do recurso cabível.
O prazo
de interposição do recurso inominado é de 10 (dez) dias (Lei n.
9.099/95, art. 42). Observo que o autor foi intimado da sentença em
11.02.2013, com prazo iniciando-se em 14.02.2013 e terminando em
25.02.2013. Devia, portanto, ter interposto seu recurso até tal data,
sob pena de não recebimento, por intempestividade.
Observo
que hoje é dia 27.02.2013. Logo, o recurso inominado a ser eventualmente
interposto é intempestivo. Desde já, deixo de recebê-lo e determino à
Secretaria que, por ato ordinatório, intime o recorrente, caso ele venha
a interpor o RI contra este decisum, momento em que poderá buscar,
querendo, junto à Turma Recursal, a prevalência de seus eventuais
argumentos, mediante interposição de expedientes processuais a serem
dirigidos diretamente àquele órgão (agravo de instrumento, mandado de
segurança, etc.) durante cuja elaboração - e análise de cabimento - terá
o embargante um excelente momento de reflexão a respeito dos
pressupostos de cabimento dos embargos e do real significado das
expressões nulidade, omissão e contradição, que lhe permitirá, numa
próxima oportunidade em que vier a ser intimado de alguma sentença,
melhor avaliar sobre a presença, ou não, dos pressupostos de cabimento
dos embargos declaratórios, diante da conclusão de que tão mais fácil
teria sido, simplesmente, encaminhar seus reclames recursais ao órgão
competente, em vez de inventar embargos de declaração para finalidades
de discutível legitimidade moral, ética, hierárquica e processual.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO aos embargos de declaração.
Condeno a parte embargante ao pagamento de multa de 1% do valor da causa (CPC, arts. 538).
Havendo interposição de recurso inominado, intime-se o recorrente por ato ordinatório, na forma da fundamentação.
Indefiro desde já e previamente todo e qualquer pedido de reconsideração desta decisão.
Sentença publicada e registrada eletronicamente.
Intimem-se.
Chapecó, 27 de fevereiro de 2013.
Guilherme Gehlen Walcher